Penso que houve um tempo, quando éramos crianças, em que nossos sentidos eram mais aguçados. Sentíamos melhor o cheirinho das flores, da chuva e do mar. Ouvíamos mais palavras de amor, mais gargalhadas gostosas e mais choros silenciosos. Tudo deveria ter gosto de primeira vez: o sorvete, a comida quente que queima a boca, o leite morno que alimenta a alma. E o que víamos era mágica: a pedra quicando no rio, os desenhos da televisão e dos livros, a imagem da mãe acendendo a luz bem no meio do pesadelo. Tudo o que tocávamos era sentido diretamente pelo coração: os grãos de areia que seriam nossos castelos, a água do chuveiro que banhava e acalentava, as mãos dos irmãos segurando firme as suas.
E penso que a melhor maneira de nos aproximarmos novamente desse tipo de sensações é através de uma nova viagem. Nela, todos os seus sentidos anseiam pela novidade. Seus olhos perseguem novas paisagens, deparam-se com outras feições, desvendam novas ruas. As cores que você vê em uma viagem são outras. O verde das árvores não é o mesmo. Você descobre que o branco da neve chega quase a cegar e, nem assim, você se cansa de olhar para ela. De repente, quando você olha para o lado, vê o céu se pintando para preparar a sua noite, usando tons de laranja, de rosa, de azul, até terminar sua exibição diurna e deixar o negro da hora tomar conta junto com a luz da lua.
Seu olfato torna-se detalhista e você faz questão de sentir o cheiro que a cidade emana. O suor das pessoas tem outro odor, as plantas têm outro aroma, os perfumes têm outras essências, as cozinhas atraem por outros cheirosos ingredientes.
Seus ouvidos estão prontos para outros sons, para ouvir um idioma que não é o seu, para escutar as músicas que você ainda não aprendeu a dançar, para ouvir o vento que percorre outras terras e todos os outros sons que fazem deste um lugar estrangeiro.
Sua boca quer sentir o gosto da novidade, dos estranhos sabores, das combinações impensadas. Ela quer enrolar a língua para se comunicar. Quer degustar outras bebidas, outros temperos. Sua boca quer morder um pedaço do novo e mastigar o que é desconhecido. Quer se deliciar. Ou enjoar! Quer sua fatia de sensações.
Suas mãos são outro par de olhos curiosos. Você quer sentir a textura dos tecidos, dos artesanatos. Você quer sentir o gelado dos flocos de neve e o calor que vem das pessoas. Você sente o frio percorrer seu pescoço, os raios de sol refletidos em seu rosto, o aconchego de uma cama diferente.
Você sente... E quando você vai embora, de todos os sentidos, um deles fica mais perspicaz. O sexto sentido... Aquele que lhe diz que você irá voltar.
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