quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Bênçãos



Quase três anos atrás, no Natal de 2013, minha mãe deu a cada um dos filhos uma caixinha de madeira pintada por ela mesma e com a palavra "Bênçãos" escrita na tampa. Junto da caixa vinha um cartão, explicando que o maior desejo de uma mãe para seus filhos é que eles tivessem muitas bênçãos e alegrias, a cada dia do novo ano, e esperava que nós soubéssemos reconhecer todas essas alegrias. Então a ideia era escrever as coisas boas que o ano de 2014 nos traria e ir colocando os papéis naquela caixinha. Desse modo, teríamos uma boa ideia do quanto éramos privilegiados com pequenas e significativas alegrias da vida.

Eu segui a proposta e, a cada acontecimento bacana dos meus dias, escrevia em um papelzinho e colocava na caixa de bênçãos. Era também um exercício de enxergar o que era bom e que, por tantas vezes, passa despercebido, quase sem o devido valor. Um café com as amigas, um dia na praia, pequenas conquistas da filha. Confesso que não consegui fazer por muito tempo. Por alguma razão, só pratiquei esse exercício de bênçãos até março de 2014.

A questão é que encontrei essa caixinha há dois dias, exatamente na véspera do meu aniversário. Dediquei um tempo para ler cada um dos papéis, relembrando, com um sorriso no rosto, de cada um deles. Compartilhei essa leitura e as lembranças com meu marido e tivemos um momento de nostalgia com essas recordações tão boas.

Percebi que todas aquelas vivências, quando relembradas agora, dois anos depois, passam a impressão de que foram ainda melhores. Ficou quase aquela sensação de que éramos mais felizes em 2014 do que agora. Mas essa é uma impressão falsa. A verdade é que tudo depende de como se olha para os eventos - atuais e passados. O que vivemos em 2014 não foi melhor. Foi apenas o que aconteceu lá e o que eu escolhi registrar: o bom, o feliz, a bênção. Naquela época também tivemos problemas, mas nenhum deles, obviamente, entrou na caixa. E os desafios foram resolvidos e ficaram para trás, quase como se não tivessem existido.

Percebi que temos uma tendência errada de focar no que não está bom no presente, no que precisa ser feito, resolvido, nas contas que precisam ser pagas, no cansaço, no que não está dando certo. Tudo isso precisa de atenção, sim, mas não precisa ser o centro de nossa atenção. Tem tantas outras questões mais importantes na vida e que, inclusive, nos fazem bem. Aquele sorriso no meu rosto ao ler as bênçãos de 2014 não deve surgir no futuro, ao lembrar de hoje. Ele deve aparecer hoje mesmo, na vivência, no presente, no tempo real da bênção.

Percebi que preciso voltar a listar as bênçãos de meus dias e que o melhor momento seria a data do meu aniversário, início de um novo ano na minha vida, um ano que será cheio de bênçãos, de momentos felizes para curtir e registrar. Um ano em que eu valorize mais os presentes do dia e lembre deles com carinho depois, recordando, também, que soube valorizar cada um desses momentos.

Percebi que o que estou fazendo hoje é o simples ato de criar recordações. Consciente disso, quero criar recordações felizes, quero a serenidade do sorriso no rosto hoje e no futuro. Essa é a bênção.