quinta-feira, 15 de abril de 2010

No campo... No mar...


Passei minha infância em uma cidade muito pequena no interior do Rio Grande do Sul. Adorava aquela cidade, a casa, as pessoas, a escola, a professora (sim, era a minha mãe, mas mesmo assim!), os amigos. E, além de viver nessa cidadezinha, havia outra coisa que me fazia feliz naquele tempo: ir para a fazenda. Não pense em grandes latifúndios! Na verdade, eu nem lembro o tamanho exato do lugar.

Quando a gente é criança, tudo se agiganta.

Mas tem algo muito peculiar ao lugar de que me lembro muito bem. Independente de conhecer as outras pessoas que moravam por lá, todos, ao passarem uns pelos outros na estrada, levantavam gentilmente a mão, abaixavam a cabeça, em sinal de cumprimento ao outro.

Hoje, na cidade, as pessoas apenas se cumprimentam caso se conheçam. Lá não é assim. As pessoas se cumprimentam em sinal de cumplicidade. Significa: “Eu sei do tipo de vida que você gosta, e eu gosto também”. Não é preciso dizer nada. Eles sabem que podem contar uns com os outros. Eles se cumprimentam. Entendem-se, mesmo sem nunca terem conversado. Habitam o mesmo parnasiano mundo.

Nunca mais fui para a fazenda. Nem aquela, nem outras. Estou mais perto do mar que do campo. Mas algo nesse lado de cá, litorâneo, é semelhante ao anterior:

Uma vez no mar, seja em um simples barquinho de pesca ou no melhor dos iates, todos fazem parte do mesmo oceânico mundo. Todos se cumprimentam. O significado é aquele mesmo: “Eu sei do tipo de vida que você gosta, e eu gosto também”. Significa expressar com um gesto de mãos, à distância, que você também é, ao seu jeito, apaixonado pelo mar. Significa que um não deixará o outro à deriva. É a cumplicidade dos que preferem a água à terra firme.

Encontrei isso no campo e no mar. Pude me sentir acolhida nesses lugares. Mas sei que essa simples tradição também ocorre em muito outros circuitos, como o aéreo. Ou vizinhos de um condomínio. Policiais. Muitos!

As pessoas precisam de outras pessoas com quem se identifiquem. Ainda é preciso saber que você pode contar com uma ajudinha de alguém que talvez você nem conheça.

Afinal, podemos até ser ilhas, mas dentro de um mesmo arquipélago.

Ainda precisamos de iguais. Ainda. E, talvez, cada vez mais.

2 comentários:

Vivian disse...

Me lembrei do Machado e as suas Ideias de Canário

Anônimo disse...

Maravilhoso!!!!!Amei muito o que escreveu... me fez lembrar da vizinha (amiga) de porta, que por muitas vezes só fazia me olhar.
Rita